AGRICULTURA
ORGÂNICA E SAÚDE
Carlos
Eduardo Cantusio Abrahão (*)
eabrahao@br.inter.net
De
9 a 12 de setembro Campinas realizou a sua 3º semana de
agricultura orgânica, em meio ao êxito de balanço
nacional e internacional altamente favoráveis ao seu
excelente desempenho na economia global. O negócio orgânico
é altamente promissor em várias partes do planeta hoje.
Os
defensores da agricultura orgânica apresentam cada vez
mais fortemente a convicção de que será melhor para a
natureza que nos sustenta, e, portanto, para nós mesmos,
uma enorme ressalva nas práticas agrícolas hegemônicas;
os agricultores orgânicos interpõem as alternativas
naturais de manejo das culturas, que não são agressivas ao
processo de regulação e alimentação de seres vivos,
na medida em que se abstêm do uso de produtos
biologicamente nocivos.
O
incentivo a uma agricultura livre de fertilizantes
artificiais e agrotóxicos (pesticidas, herbicidas, etc) é
crescente não só no Brasil, e está ligado diretamente ao
conhecimento que se amplia, dos potenciais efeitos maléficos
ao equilíbrio ecológico, da abundante adição de produtos
ou tecnologias no solo e nos alimentos, para o controle de
pragas e aumento da produção.
Esses
produtos acabam por permanecer residualmente na água e nos alimentos,
e nos próprios trabalhadores rurais e demais espécies
vivas, oferecendo possibilidades completamente
desconhecidas de interferência na intimidade dos
delicados processos de auto-regulação da vida, com
efeitos não completamente dimensionados ou conhecidos.
A água e os alimentos são base de sustentação da vida.
Sua progressiva contaminação com substâncias químicas tóxicas
poderá estar acumulando conseqüências nocivas para
diversas espécies sensíveis, incluindo a humana.
Diversos
autores têm discutido a questão. A velocidade de lançamento
de produtos e tecnologias com potenciais impactos ambientais
e sociais nocivos, em nome do conforto e das questões
de mercado, nem sempre está sendo acompanhada da
criteriosa adoção de medidas para a prevenção
de seus eventuais efeitos nocivos ao homem e à
natureza, quando isso é possível. Importante questão de
saúde pública e ambiental permanece não respondida: quais
seriam os efeitos de longo prazo da atuação dessa
quantidade enorme e diversificada de produtos químicos e
biológicos artificiais adicionados continuamente ao solo,
aos alimentos, e às águas de irrigação e abastecimento
público?
Não
há análises contínuas que pesquisem a presença de
residuais químicos e tóxicos na água que é
consumida pela sociedade, pois está distante ainda da
realidade a infraestrutura da rede laboratorial disponível
para esse fim. Essa retaguarda deve atender também à
pesquisa de presença de residuais tóxicos nos alimentos,
sendo elevados os custos de todo esse processo.
Não
é de fato a ciência que vem apresentando obstáculos à
agricultura não orgânica mas o cidadão que em
qualquer lugar do planeta já está consciente da não
sustentabilidade das práticas agrícolas ainda hegemônicas.
Agricultura orgânica é um bom exemplo de como o senso
comum e os próprios interesses de mercado aplicam na vida o
princípio da precaução: não esperam demonstração dos
efeitos nocivos de uma tecnologia, aplicam a cautela já.
E
a saúde pública também apresenta a preocupação com a
fraude ao consumidor quando da não comprovação da origem
orgânica do alimento, além de que o custo desses produtos
orgânicos tem sido substancialmente maior. O processo de
certificação da agricultura orgânica está paradoxalmente
encarecendo-a, permitindo que o consumidor consciente, mas
com poder aquisitivo, pague agora esse preço, para evitar
no futuro um mal maior para si e os seus.
Os
custos mais elevados da agricultura orgânica configuram um
paradoxo: alimentos mais baratos porque potencialmente
contaminados encarecendo os custos de longo prazo pela
agressão social ambiental e desequilíbrios ecológicos daí
decorrentes. Agricultura orgânica mais cara hoje protegendo
de determinadas doenças aqueles que podem arcar com maior
despesa alimentar. Contradição e iniqüidade de leis de
mercado.
(*)
Carlos Eduardo Cantúsio Abrahão é médico, sanitarista,
coordenador de saúde ambiental da Secretaria Municipal da
Saúde de Campinas e vice-presidente do Conselho de Meio
Ambiente (COMDEMA) de Campinas.