INFORME ROTAVÍRUS

Campinas, 3 de dezembro de 2004

Considerada doença emergente, o rotavírus tem sido uma das principais causas de diarréia em crianças menores de 5 anos no mundo e não tem sido diferente aqui em Campinas demonstrado pelo alto coeficiente de incidência dos casos notificados (gráfico 1) e tem sobrecarregado o atendimento nas unidades de saúde.

A infecção pelo rotavírus varia de quadro leve com diarréia aquosa e duração limitada a quadros graves com desidratação, febre e vômitos podendo evoluir a óbito. Os dados relativos a incidência no Brasil e no Estado de São Paulo são bastante limitados. Nos Estados Unidos é a principal causa de diarréia grave, sendo responsável por 5 a 10 % de todos os episódios diarréicos em menores de 5 anos.Também aparece como causa freqüente de hospitalização, de atendimentos de emergência médica. 

É uma doença altamente transmissível sendo transmitidos pela via fecal-oral, por contato pessoa a pessoa e também por fômites. A máxima excreção do vírus se dá no 3º a 4º dia quando se recomenda a coleta de fezes para diagnóstico. Para sorologia é o ELISA e para genotipagem o PCR. 

 O período de incubação varia de 1 a 3 dias e o quadro clássico da doença é a apresentação de diarréia de forma abrupta caracteristicamente aquosa com aspecto gorduroso de caráter explosivo com duração de 4 a 8 dias. 

Por ser em geral, doença autolimitada, o fundamental do tratamento é prevenir a desidratação e distúrbios eletrolíticos. Não se recomenda o uso de antimicrobianos. As complicações são raras. 

O rotavírus torna-se de notificação compulsória a partir do surto e uma vacina eficaz seria a medida profilática de maior impacto pois medidas higiênicas convencionais tão importantes na profilaxia de gastroenterites por outros patógenos, no caso, parecem não surtir muito efeito na incidência da doença. 

A vacina apesar de estar nas fases finais de testes com ensaios clínicos amplos conduzidos na América Latina, ainda não está disponível para ser utilizado em larga escala pois dependem de mais estudos conclusivos na população para garantir a segurança do imunobiológico assim como aspectos relativos à relação custo-benefício. 

Dos 7 grupos sorológicos do rotavírus classificados no mundo até o momento, apenas três, o sorogrupo A, B e o C são associados a doença no homem. O grupo A predomina na natureza tanto nos animais como no homem. Tanto que a maioria dos Kits diagnósticos são feitos a partir do grupo A . Na América Latina são tipificados os genotipos G e P através do PCR. 

No Brasil, a infecção segue uma distribuição sazonal com maior incidência entre os meses de abril a setembro. Está em curso nas 5 regiões do país o monitoramento do genotipo circulante, desenvolvido pelo Ministério da Saúde e diversas organizações nacionais e internacionais. Até o final da década de 90 o genótipo G5 foi o predominante porém estudos recentes mostram que há uma circulação freqüente do genotipo G9, considerado emergente. 

No município de Campinas registramos pelo 2º ano consecutivo o surto  neste mesmo período, caracterizando a sazonalidade, no período do inverno seco e de forma disseminada pela cidade (gráfico 2).

Neste ano houve uma predominância de residência no distrito sul de 51% com uma incidência de 670 por 100 mil que atendeu a maioria dos casos (70,5 % do total) ocorridos no município. No ano passado os casos se concentraram no distrito noroeste que mais notificou casos, demonstrando que pode não se tratar de incidência real O distrito sudoeste embora tenha notificado apenas 2,7% dos casos, foi o 2° distrito que mais casos teve por local de residência, com 19 % e coeficiente de incidência de 354 por 100 mil. (gráfico 3)

Foram realizados no total apenas 5,5% de exames (201) do total de 3644 casos notificados porém apesar da pequena quantidade de exames realizados, resultou em uma alta positividade de 56,2% (113).(gráfico 4)

 

Não houve proporcionalidade entre notificação e realização de exames. O distrito sul que mais notificou casos solicitou apenas 1,6% de exames. O distrito sudoeste que notificou apenas 2,8% dos casos, encaminhou para exames 85,9 % dos casos (gráfico 5) e teve a maior positividade de 52,2% (gráfico 4) porém como estes casos resultaram da notificação de laboratórios, não temos maiores informações como idade, local de residência sendo prejudicada a análise do surto nesta região.

Os serviços que mais notificaram casos foram o Pronto Atendimento São José ( 1291 casos)  e o  Pronto Socorro Infantil do Hospital Municipal Dr Mário Gatti (1275 casos). onde houve um aumento exacerbado no atendimento de diarréias, alguns casos com sinais de gravidade.

A notificação destes surtos de rotavírus não tem sido simples por não serem restritos a instituições como creche ou hospitais e muitas vezes para os Centros de Saúde é difícil caracterizar o surto quando está disseminado na cidade.

Foi realizado um contato com a Divisão de Hídricas do CVE/EPI-SUS que desencadeou uma investigação epidemiológica para caracterizar melhor o surto. Foi feito um estudo de coorte retrospectiva e a região sul foi escolhida pela maior incidência. Feito definição de caso e controle e a equipe composta por integrantes do estado e município* saiu para investigação a campo onde foram aplicados questionários (12 casos e 103 controles) com fatores de risco. As conclusões preliminares confirmaram transmissão pessoa-a-pessoa, via fecal-oral com evidências de contato domiciliar e convívio próximo.

Este ano, em agosto, iniciamos o programa de Monitorização de Doenças Diarréicas Agudas (MDDA) preconizado pelo Ministério da Saúde para detectar precocemente surtos e esperamos com isto melhorar o conhecimento de etiologia. Este surto de rotavírus já estava sendo esperado devido a sazonalidade. O serviço sentinela detectou precocemente o surto verificado no gráfico 6 e representou 47% do total de casos notificados.

Provavelmente há ainda uma grande sub-notificação, pois temos informações de que o aumento de atendimento das diarréias na cidade foi geral tanto nos serviços públicos quanto nos privados. A notificação da totalidade de casos neste caso não é o objetivo desta vigilância.

O MDDA está proposto como vigilância sentinela, mas devemos trabalhar para melhorar aspectos de gravidade da doença com os hospitais. Não tivemos nenhum registro de óbito mas os casos graves que chegavam pela imprensa ou pelos médicos não chegaram a ser notificados. Indiretamente podemos supor a gravidade pelo tratamento C que representou 21,5% na média de todas unidades e 33,8% se considerarmos as unidades sentinelas.

Mesmo com relação aos sentinelas a escolha do Pronto-Atendimento torna altamente sensível o sistema porém como a anotação dos casos ainda é manual a grande demanda desta unidade faz com que a mesma informação seja transcrita ou digitada tendo o trabalho duplicado ou até triplicado. Além do que chega atrasada a informação escrita quando se planilha os dados. Em função disto passaremos a privilegiar a monitorização em Centros de Saúde e montaremos um sistema de contagem rápida para os Pronto-Atendimentos para que possamos valorizar tanto a quantidade como a qualidade da monitorização.

Outra questão importante: o sistema implantado nos hospitais , o HOSPUB do DATASUS deveria conversar com outros sistemas e que seja otimizado o seu uso para fins de vigilância/monitorização e sirva ao MDDA e aos outros agravos/surtos que assolam o nosso município.

Desde o ano passado esta alta ocorrência de diarréias têm nos intrigado. O baixo encaminhamento de exames, apesar de alta proporção de confirmados, faz com que uma grande proporção fique classificado como “altamente provável”.

O Instituto de Biologia da Unicamp – Departamento de Virologia  é uma das instituições que nos tem apoiado tanto na realização de exames para o rotavírus como na discussão mais esclarecedora da vigilância do rotavírus e na compreensão das diarréias. 

No nosso meio foi detectado rotavírus do grupo A e parece que não houve mudança no padrão de circulação de genótipo. Em 2 reuniões realizadas em conjunto também com o Instituto Adolfo Lutz – Virologia do nível central e nível regional de Campinas e o CVE – Divisão de Hídricas, ficamos de melhorar a nossa busca etiológica.

As perspectivas para a continuidade do MDDA é o aprimoramento, melhorar a análise local e regional, dar agilidade para investigação, esclarecimento e orientações ou intervenções necessárias e a busca de etiologias além do rotavírus pois a pesquisa para outras etiologias foi praticamente nula diante desse grande número de casos de diarréias que foram notificados ao sistema.

FONTE:

Planilhas MDDA.

População: Estimativas da Coordenadoria de Informação e Informática da Secretaria de Saúde a partir do IBGE 2000

Bibliografia:

1. SES/CIP/CVE – Divisão de Hídricas: Manual de Doenças Transmitidas por Água e Alimentos : Rotavírus.

2. OMS/OPS - Área da Saúde da Família e Comunidade/Unidade de Imunizações – Reunião Regional sobre a Implementação da Vigilância Epidemiológica de Rotavírus. Lima, Peru. Setembro de 2003.

Colaboradores:
Técnicos da Vigilância em Saúde dos distritos, toda a rede, especialmente as unidades sentinelas: PA Anchieta, PA São José, os Centros de Saúde: São Quirino, DIC III e Floresta e os NVE Mário Gatti, NVE Celso Pierro, Hospital Albert Sabin, o laboratório municipal, o laboratório do Hospital Mário Gatti e a Coordenadoria de Informação e Informática.

Responsáveis por este informe:
Brigina Kemp, Naoko Yanagizawa J da Silveira e Idalvo Saglioni - CoViSA.