Talita El Kadri
Profissionais da área de
saúde mental de Campinas participaram de segunda-feira a
sexta-feira desta semana, de 28 a junho a 1º de julho, em
São Paulo, na ITM Expo, do Congresso Brasileiro de
Centros de Atenção Psicossocial (Caps). O evento, inédito
na experiência brasileira, tratou da reforma psiquiátrica
que tem como principal diretriz cuidar em liberdade e
promover a cidadania ao portador de transtornos mentais
por meio da desospitalização, redução progressiva de
leitos e assistência extra-hospitalar.
Segundo o Ministério da
Saúde, o objetivo do congresso era discutir o que
acontece nos serviços de saúde mental, apontar desafios
da atenção diária e da reabilitação psicossocial e,
principalmente, promover a troca de experiências e idéias
entre os participantes. Ainda de acordo com o Ministério,
as discussões e idéias levantadas no Congresso vão
servir para a melhora do sistema psiquiátrico nacional.
"Alcançamos tudo o
que propusemos. O Congresso foi também um momento de
reunir os profissionais da área e refletir sobre esse
trabalho", diz a médica sanitarista Rosana Onocko
Campos, uma das organizadoras do evento.
Campinas levou
representantes de cada um dos seus nove Caps, além de
coordenadores de saúde mental, supervisores e gestores.
Estiveram presentes também usuários da rede de atenção
psicossocial na cidade, como Luciano Lira, do Caps Novo
Tempo e do Núcleo de Oficinas de Trabalho (NOT) do Serviço
de Saúde Cândido Ferreira. Luciano compôs a mesa do
grupo de discussão "Construindo políticas de saúde
mental: a participação dos trabalhadores, usuários e
familiares".
A cidade apresentou sua
experiência como uma das primeiras no Brasil em responder
à reforma psiquiátrica. Rosana Onocko confirma o
pioneirismo do município e diz que, comparada a outras
cidades, Campinas está muito avançada. "O sistema
surgiu e cresceu, agora espera-se consolidar ainda mais o
trabalho", afirma.
A psicóloga do Caps
David Capistrano, Roselaine Alves Tavares, participou do
Congresso e disse que volta com esperanças e inquietações.
"Quero garantir a continuidade do movimento e tenho o
compromisso de fazer dar certo – e conta sobre a troca
de experiência com outras 2 mil pessoas - compartilhamos
também as dificuldades, propusemos soluções e vi que não
estou sozinha nessa luta".
Marcus Vinicius de
Oliveira, do Conselho Federal de Psicologia, falou sobre o
início do movimento antimanicomial no país. "Foi
preciso demonstrar para a psiquiatria brasileira que o
sistema funciona. É preciso avançar ainda mais no
fechamento de manicômios e hospitais psiquiátricos".
Rede ampliada.
Campinas dispõe hoje de uma rede de cuidados comunitários
de saúde mental do Sistema Único de Saúde (SUS)
constituída por nove Caps, quatro deles com 32 leitos, em
que psiquiatras, psicólogos, terapeutas ocupacionais e
enfermeiros tratam os pacientes em liberdade para reabilitá-los
ao convívio social e familiar.
Atualmente, a cidade
conta também com três Centros de Convivência, todos
inaugurados nos últimos três anos. Nestes espaços, as
pessoas desenvolvem trabalhos em esquema de cooperativa e
participam das oficinas de dança, música, ginástica,
ioga e de outros momentos de convívio.
O município também
disponibiliza 33 repúblicas ou residências terapêuticas
com aproximadamente 150 pacientes ex-moradores de
hospitais psiquiátricos, várias oficinas de
profissionalização e mais de 300 postos de geração de
renda para os usuários, além de integrar o De Volta para
Casa – um programa Ministério da Saúde que destina um
benefício mensal de R$ 240 para ajudar no processo de
ressocialização de portadores de transtornos mentais que
tenham passado pelo menos dois anos internados em
hospitais e clínicas psiquiátricas.
A Secretaria Municipal de
Saúde ainda ampliou serviços nos centros de saúde e,
numa ação inédita, implantou serviço psiquiátrico de
plantão no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Com esta infra-estrutura, a cidade tornou-se, então,
referência na área da saúde mental e é apontada – ao
lado de Santos – como pioneira nos avanços da reforma
psiquiátrica no país.
"A cidade reúne
belos exemplos de atitudes terapêuticas e respeito aos
pacientes, ao garantir-lhes, pelos Caps, a prerrogativa
cidadã de ir e vir. Campinas antecipou-se à portaria n0
336/2002, do Ministério da Saúde, criando os Caps
substitutivos de atenção desde a crise até a recuperação",
diz Florianita Coelho Braga, ex-coordenadora de Saúde
Mental de Campinas.