Serviço Exemplar

Projeto Iluminar

Campinas aposta em ações integradas para tratar a violência sexual 

"Transformar a violência sexual em uma questão de saúde pública, ampliando a assistência e reduzindo os danos causados às vítimas.
Mais que isso, envolver todos os órgãos públicos na criação de uma rede de trabalho capacitando os profissionais envolvidos de forma direto e indireta com o problema e disponibilizando dados confiáveis para que sejam usados em políticas futuras."

Com esses objetivos, a cidade de Campinas, no interior de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Saúde e em parceria com o Ministério da Saúde, criou o Projeto Iluminar Campinas - Cuidando das Vítimas de Violência Sexual.

Desde agosto de 2001, com a capacitação dos primeiros profissionais, o projeto vem atendendo não só as mulheres e crianças, maiores vítimas desse tipo de abuso, mas também homens. Essa opção tem surtido efeito: nos primeiros sete meses foram notificados mais de 60 casos de garotos que sofreram violência, algo difícil de acontecer num serviço convencional.

O Iluminar é coordenado pela assessora de saúde da mulher da Secretaria de Saúde da cidade, Verônica Gomes de Alencar. "O atendimento por um guarda municipal ou pelos ´pontos de luz´ - como são chamados os profissionais responsáveis pelo acolhimento das vítimas de forma mais eficiente e abrangente - oferece inicialmente uma boa assistência médica, incluindo eventual profilaxia para infecção por HIV e DSTs. Isso tira o primeiro grande trauma da vítima, que já se sente acolhida", explica.

Capacitação direita e indireta

A capacitação dos profissionais para assistência envolve não só os profissionais de saúde, mas também outros órgãos e secretarias como as de Assistência Social, Segurança e Educação, bem como toda a sociedade. A intenção é  diminuir os índices de violência sexual por meio de ações em conjunto; acolher e orientar as vítimas em qualquer local, encaminhando-as para o serviço de saúde mais próximo, afim de amparar sua família ou mesmo para esclarecer sobre as questões legais que envolvem o problema.

Para um atendimento de forma indireta, a primeira capacitação contou com 400 profissionais e envolveu a guarda municipal, os conselhos tutelares e a delegacia da mulher. outros 180 profissionais também foram capacitados nos pronto-socorros e serviços de urgência e emergência para atenderem de forma direta.

"Em julho deste ano nós iremos capacitar mais 380 profissionais da rede de serviços médicos. Com isso, todos os centro de saúde serão capacitados", lembra Verônica.

Atendimento Complementar

Uma das principais perspectivas do projeto é estender o atendimento às vítimas para além dos consultórios médicos. Elas poderão ser orientadas, num primeiro momento, por outros setores - como creches, guarda municipal e delegacia da mulher - a procurar o pronto atendimento.

"Após o primeiro atendimento, resta a questão da saúde mental, que será tratada no centro de saúde, os direitos da vítima, que serão abordadas no momento em que é feito o exame de corpo e delito num local adequado e a notificação ao Conselho Tutelar, no caso de crianças. Quanto a questão social, orientamos as escolas e a sociedade para que não marginalizem aqueles que passam por esse tipo de situação", explica a coordenadora.

Com isso, pretende-se orientar e encaminhar  tanto a vítima como o agressor de forma eficaz.

Notificação compulsória e banco de dados

A identificação e notificação de todos os atendidos é feita de maneira compulsória a fim de se conhecer mais sobre as vítimas. "É um tipo de dado que só existia na polícia e requeria que fosse feito o Boletim de Ocorrência. Por constrangimento ou medo de exposição, a maioria das mulheres não faz o boletim".

Espera-se com isso que aumentem os números registrados. Isso dará subsídios par a criação de novas políticas num primeiro momento. Posteriormente, poderá auxiliar na prestação de assistência também a quem agride. Para Verônica, "embora o normal seja querer somente a punição do agressor, existe um dado estatístico mostrando que 30% dos agressores sexuais já sofreram violência sexual na infância; na verdade eles têm um histórico de doença mental. Por isso tivemos a definição política de atender homens."]

Uma luz para as vítimas

O nome do projeto, Iluminar Campinas, deve-se aos "pontos de luz", os profissionais distribuídos em todos os setores da sociedade responsáveis pelo acolhimento das vítimas de forma mais eficiente e abrangente. Eles também têm  função de orientar o restante da população de como agir nesses casos. Segundo Verônica, "cada serviço é um 'ponto de luz' e a responsabilidade é que aquele serviço faça a capacitação de todos os funcionários do local".

O período de atendimento e acompanhamento aos pacientes tem os dados registrados num relatório, que é chamado de diário de bordo. A partir do trabalho em rede, com ações em conjunto, chamado de constelação, o conceito de assistência acaba sendo mudado para o de cuidador.

"Em breve iremos realizar o primeiro encontro dos 'pontos de luz', para fazermos uma avaliação de como está sendo o atendimento", completa a coordenadora do projeto.

Iluminar significa, portanto, proporcionar o resgate de uma vida normal para essas pessoas, interrompida pela violência sexual.

Fonte: Jornal do Cremesp 
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
Nº 178 - Junho 2002

Página atualizada em Julho / 2002